PL 4.675 desperta alerta no mercado de tecnologia

Criado para regular as big techs, o PL 4.675 pode acabar impactando empresas muito além do que o governo imagina.
O Projeto de Lei nº 4.675/2025, encaminhado pelo Governo Federal, promete redefinir a forma como o Brasil regula a atuação das grandes empresas de tecnologia. Elaborado pela Secretaria de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, em conjunto com um grupo técnico coordenado pela Casa Civil, o texto propõe uma nova estrutura de regulação econômica e concorrencial que pode ter efeitos muito além das chamadas big techs.
A proposta altera a Lei nº 12.529/2011, que rege o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, para introduzir instrumentos voltados à promoção da competitividade em plataformas consideradas de “relevância sistêmica”. O objetivo seria prevenir práticas de abuso de poder econômico, criando mecanismos de monitoramento contínuo sobre empresas que possuem grande influência digital e financeira.
Entre as mudanças, o projeto prevê a criação da Superintendência de Mercados Digitais, vinculada ao CADE, com poderes de regulação preventiva sobre companhias que ultrapassem R$ 5 bilhões em faturamento no Brasil ou R$ 50 bilhões no exterior. Além do critério econômico, também entram na lista empresas com grande volume de dados ou presença em diversos setores simultaneamente, fatores que ampliam sua capacidade de influência.
A definição de quais plataformas serão classificadas como “sistemicamente relevantes” ficará a cargo de um processo administrativo, posteriormente validado pelo tribunal do CADE. O comando da nova Superintendência será exercido por um superintendente indicado pelo presidente da República e aprovado pelo Senado Federal, com mandato de dois anos. O cargo exige notório saber jurídico ou econômico, reputação ilibada e idade mínima de 30 anos.
Apesar de ser apresentado como uma resposta à concentração de poder das big techs, o projeto também levanta críticas. O governo defende a proposta como um meio de corrigir distorções concorrenciais, enquanto a oposição alerta para o risco de excessiva intervenção estatal em setores guiados pela inovação e pela livre iniciativa. No entanto, o ponto mais sensível é que o texto, embora focado em gigantes como Amazon, Google, Meta, Microsoft e Apple, pode atingir outros segmentos de forma não intencional.
Um exemplo disso é o mercado de ativos virtuais, amplamente ignorado nas discussões legislativas. As exchanges de criptomoedas já movimentam cifras bilionárias e exercem papel relevante tanto no sistema financeiro tradicional quanto no ecossistema cripto, mas o projeto não diferencia suas particularidades. O conceito de “plataforma digital”, usado de forma ampla e sem definição precisa, pode facilmente englobar prestadores de serviços de ativos virtuais.
Com essa redação genérica, o PL acaba por abrir espaço para enquadrar exchanges nos mesmos critérios aplicados às grandes empresas de tecnologia. Caso aprovado sem ajustes, o texto permitirá que o CADE fiscalize o setor de criptoativos e imponha medidas preventivas de caráter concorrencial, mesmo sem critérios específicos que considerem as diferenças desse mercado.
Esse cenário se agrava pela ausência de debate técnico. O Banco Central, responsável por definir a estrutura normativa do setor de ativos virtuais, ainda não concluiu o processo regulatório, deixando lacunas que aumentam o risco jurídico para as empresas do segmento. Assim, uma legislação pensada para gigantes digitais pode acabar recaindo sobre um mercado em consolidação, prejudicando sua evolução.
Se permanecer inalterado, o Projeto de Lei nº 4.675/2025 poderá criar um ambiente de insegurança regulatória, limitando a expansão das empresas de criptoativos e desestimulando a inovação tecnológica. O país correria o risco de repetir um erro recorrente: regular sem compreender o funcionamento dos setores afetados. Ao ampliar o alcance da lei sem base técnica sólida, o Brasil pode acabar sufocando um dos mercados mais promissores da nova economia digital.